Thursday, November 16, 2006

A sul - 20 de Novembro

Barragens, sim ou não?

Decorreu quase um ano desde que a Direcção-Geral de Geologia e Energia deu "luz verde" à EDP para construir duas novas barragens na região de Trás-os-Montes e Alto Douro. Se a da Foz do Tua é um processo iniciado há pouco tempo e ainda em fase de estudos geológicos preparatórios, a do Baixo Sabor encontra-se num processo mais avançado de decisão.
Como sempre acontece em empreendimentos do género estão formadas duas barricadas na defesa intransigente dos projectos ou na sua inflexível condenação. Os ambientalistas da Plataforma Sabor Livre, que congrega várias associações de defesa do ambiente, tentam inviabilizar o financiamento comunitário da barragem do Baixo Sabor com base no que consideram «a destruição iminente de património de interesse europeu, incluindo uma área proposta na Rede Natura 2000 e uma Zona de Protecção Especial no âmbito da Directiva Aves». Os autarcas dos municípios ribeirinhos ao rio Sabor são unânimes na avaliação das virtualidades de execução do projecto e recentemente reforçaram a apologia ao encomendar uma sondagem que mostra que 80% da população dos concelhos afectados – Mogadouro, Macedo de Cavaleiros, Alfândega da Fé e Moncorvo – são a favor da sua construção, sendo apenas 6,5% os que se lhe opõem. Do seu lado posicionam-se os eurodeputados portugueses no Parlamento Europeu que pediram ao comissário do Ambiente um parecer favorável (julgo que imprescindível) da Comissão Europeia sobre a construção da obra.
No que respeita à barragem projectada para a Foz do Tua, do lado da contestação, além de alguns ambientalistas ainda não totalmente organizados, surge uma cisão evidente dos autarcas dos concelhos limítrofes – Carrazeda, Alijó, Murça, Vila Flor e Mirandela. O presidente do Município de Murça, João Teixeira e o de Mirandela, José Silvano têm liderado a oposição ao projecto e apontam danos irreparáveis para a região se for erigida a obra: dezenas de hectares de vinhas e olivais serão submersas bem como a linha de caminho-de-ferro do Tua, acresce ao referido a possível destruição ambiental de um dos últimos rios selvagens do mundo. Os benefícios locais putativamente retirados do investimento serão sobretudo turísticos.
Comparativamente, as vantagens da construção de barragens no rio Douro para o país são hoje quase unânimes. Os empreendimentos contribuíram em 40% para a produção nacional de energia hidroeléctrica, tornaram o rio navegável e consequentemente possibilitaram o fluxo turístico, domesticaram a impetuosidade invernosa do rio diminuindo as cheias na Régua e Porto e durante muitos anos possibilitaram a energia mais barata na cidade Invicta. Isto é, somos contribuintes para um bem nacional, que é a energia eléctrica e o turismo, mas o investimento e as mais valias em termos locais foram pouco mais que zero. A electricidade tem o mesmo preço do resto do país com a agravante de possuirmos uma das piores redes de distribuição com cortes constantes. Em termos de projectos turísticos pouco mais se executou que um ou outro cais e assistimos impávidos e serenos à passagem de mais cem mil turistas por ano sem que mais valias fiquem na área geográfica. O Douro continua a ser a região do país com piores índices de desenvolvimento.
Por outro lado, a história demonstra que a EDP sempre explorou o mais que pôde, utilizando a violência do Estado para expropriar de qualquer maneira a preços ridículos e dar pouco em contrapartidas.

Os carrazedenses foram surpreendidos pelo assassinato de duas pessoas na aldeia de Codeçais, cujo acto foi perpetrado por um "tresloucado”. O indivíduo esteve preso durante cerca de vinte anos e pouco depois de ser posto em liberdade comete vários outros crimes, culminando na tragédia referida. Os factos alertam para a pertinência de nos questionarmos sobre a validade da reintegração dos presos. As notícias reportam ainda que teria havido a notificação da perigosidade do indivíduo por parte duma moradora ao Senhor Governador Civil de Bragança. Outros teriam alertado as autoridades para a sua postura alucinada e provocadora. Nada foi feito! A tragédia aconteceu! Para além de outras, fica a incómoda pergunta: podiam ter sido evitadas duas mortes, se houvesse prevenção?

São bem visíveis os cães de caça a deambular pelas estradas e caminhos da região que são abandonados pelos caçadores nesta época do ano. Para além da fome que os mitiga, arrepia o desespero que transparece no seu olhar. Muitos deles aparecem atropelados, outros tornam-se vadios ou são recolhidos pelos canis municipais. Este é um acto sem piedade que revela profunda desumanidade e se vai repetindo todos os anos.

A sul - 6 de Novembro

A crise na Casa do Douro condicionará o desenvolvimento da região do Douro

A Casa do Douro nasce em 1932 com o regime corporativo e é por este encarregue de proteger e disciplinar a produção. Foram-lhe atribuídos poderes, entre outros, de distribuir o benefício e fiscalizar o vinho na região demarcada do Douro. Constitui-se como um sustentáculo da vitivinicultura duriense, pois era o garante do escoamento da produção dos seus associados, na sua maioria pequenos agricultores. De há uns anos a esta parte, a sua importância tem diminuído. A primeira machadada foi dada em 1995 quando foi criada a Comissão Interprofissional da Região Demarcada do Douro (CIRDD), no qual tinham assento, em situação de absoluta paridade, os representantes da lavoura e do comércio, com o objectivo comum de disciplinar e controlar a produção e comercialização dos vinhos da região. Este modelo veio a sofrer nova alteração em 2003 e foi substituído por um Conselho Interprofissional integrado no Instituto dos Vinhos do Douro e Porto (IVDP). Em termos formais, e conforme estabelece a sua Lei Orgânica, a missão do IVDP é a supervisão da viticultura duriense cabendo-lhe a certificação dos vinhos e a disciplina do sector.

A perda de influência da estrutura associativa está também directamente relacionada com o aumento da concentração da produção do vinho do Porto. No presente, cinco grandes grupos controlam cerca de três quartos (73 por cento) de um negócio que em 2005 se cifrou em 405 milhões de euros. Os grandes grupos estão a assenhorear-se sobretudo de propriedades de alto valor, reforçando a produção própria dos vinhos destinados às categorias especiais (vintage, late bottled vintage e "Porto" com indicação de idade, produtos que estão a ganhar um peso crescente nas vendas globais). Para as categorias especiais, os "grandes" recorrem cada vez mais à produção própria; e, para os vinhos comuns, compram aos pequenos viticultores individuais e às cooperativas que acolhem as pequenas produções de muitos dos produtores durienses, a maior parte deles com colheitas inferiores a cinco pipas/ano (2500 litros). Daqui decorre um abaixamento dos preços pagos à produção (uma pipa de 550 litros está a ser vendida entre os 825 e os 900 euros, preços praticados há dez anos atrás). Esta concentração do negócio dos vinhos da região demarcada desde a produção à comercialização é também visível na diminuição dos comerciantes com dimensão acima da média, de 61 em 1999, para apenas 46 no ano passado.

Actualmente a Casa Do Douro representa 40 mil viticultores e está esvaziada das anteriores funções que lhe forneciam mais valias e importância estrutural. A situação piora com o endividamento brutal fruto da aquisição de 40% das acções da Real Companhia Velha, encorajado pelo governo de Cavaco Silva e sucessivas gestões ruinosas. A dívida total da instituição atinge os 127 milhões de euros. Não estando autorizada a realizar capital com a venda de vinhos em estoque para não desestabilizar o mercado e não obtendo ajuda financeira governamental, a instituição está num beco sem saída, cuja maior visibilidade é o não pagamento aos seus funcionários.

Muita da população a viver no Douro é proprietária de pequenas explorações e sempre tiveram o guarda-chuva da segurança enquanto associados numa estrutura forte como era a Casa do Douro. A reorganização do sector por parte da administração central não soube acautelar os interesses dos pequenos em detrimento dos grandes. O decréscimo da importância da instituição duriense, e até o seu propalado desaparecimento, agravará os condicionalismos que sofre a região.

De uma rajada, organizaram-se dois eventos em Carrazeda de Ansiães pretensamente para planificar o nosso desenvolvimento colectivo. Foram eles o “Fórum Participativo da Agenda 21 Regional do Nordeste Transmontano” também realizado em oito municípios do distrito de Bragança que pretende identificar áreas prioritárias de investimento para organizar um plano de acção de desenvolvimento local e regional. Um outro encontro dos “Municípios de Áreas Rurais de Baixa Densidade”, cujo principal objectivo é “ganhar voz junto do poder central”. O rescaldo vai para o aplauso sobre as boas intenções das iniciativas. Só que… os autarcas e os técnicos ficam a falar e a confraternizar uns com os outros, pois os agentes de desenvolvimento, os jovens e demais parceiros essenciais não são mobilizados. Como Ricardo de Magalhães, vice-presidente da Comissão Coordenação e Desenvolvimento da Região Norte, também participante, referiu “os parceiros da sueca são sempre os mesmos” e assim não se vai a lado nenhum.

O New York Times refere que, no papel de língua materna, o português é mais falado do que o francês, o alemão, o italiano e o japonês: A língua de Camões é falada, no presente, por mais de 230 milhões de pessoas, dos quais cerca de 80 por cento são brasileiros. O “português com açúcar”, como chamou Eça ao “sotaque” brasileiro é a grande força do idioma luso. Menosprezar esta realidade que passa também pelos países africanos de Língua Oficial Portuguesa é diminuir uma língua que nos une.

A sul - 23 de Outubro

Uma região desenvolvida para um país mais ordenado

O diagnóstico da situação socioeconómica no Douro e Alto Trás-os-Montes é arrasador: “condições naturais adversas, de difícil acessibilidade, com tecidos económicos e sociais frágeis, e uma ocupação dos solos dominada por manchas florestais em grande parte mal ordenadas, degradadas e recorrentemente afectadas por incêndios florestais”.

O despovoamento cresce a um ritmo implacável, podendo registar-se até 2020 uma redução de cerca de 20% de uma população que se situa actualmente em 445 mil habitantes (o desejável seria não descer muito abaixo dos 430 mil habitantes, isto é pouco mais de 3%).

A riqueza produzida é 2,7% do PIB nacional (devia ser o dobro). O emprego no sector primário (agricultura) tem ainda um peso entre três e quatro vezes a média do País. A economia tem uma grande dependência dos serviços colectivos (escolas, equipamentos de saúde e segurança social) e da Administração, (leia-se funcionalismo público e autárquico).

Esta é a descrição catastrófica do Programa Nacional da Política e do Ordenamento do Território (http://www.territorioportugal.pt) encomendado pelo governo e agora em discussão pública, que pressupõe o grande objectivo estratégico – “um país bem ordenado”.

Os cenários propostos de desenvolvimento apontam para que a agricultura, a silvicultura e a pecuária continuem a manter um peso decisivo na estrutura económica da região. Para além destas, a grande aposta terá de se concentrar no turismo e a consequente dinamização nos restantes serviços. Os reptos de investimentos na área serão: “patrimónios mundiais (Douro Vinhateiro e Arte Rupestre do Côa), rio Douro, quintas, solares, paisagens, identidade cultural das aldeias e pequenas cidades, termalismo…”

As grandes opções do desenvolvimento do interior passam também por potenciar as cidades nos eixos do IP3 (Lamego, Régua, Vila Real e Chaves) e do IP4 (Vila Real, Mirandela e Bragança). A posição estratégica da região deverá ainda permitir reforçar a cooperação transfronteiriça de modo a explorar outros mercados e realizar projectos comuns.

A grande novidade é a de organizar uma “rede de excelência” de espaços rurais de molde a certificar bons e genuínos produtos autóctones, se possível com denominação de origem que ofereçam ainda qualidade de ambiente e património; propõe-se ainda a ordenação de zonas protegidas de modo a potenciá-las para um desenvolvimento local.

O triângulo onde assentam as propostas é constituído pela agricultura, turismo e certificação de produtos. A política de subsídios da Comunidade para o sector agrícola vai cair drasticamente na próxima década; as regiões de turismo estão desadaptadas às novas realidades e sobram os empecilhos a uma renovação desejada; a certificação só se consegue com uma ligação urgente do ensino superior aos produtores. Uma obra ciclópica.

A concretização das medidas será feita com planos sectoriais, especiais, regionais, intermunicipais e municipais que criará ou reformulará novas coordenações hierarquizadas, burocráticas e complexas; quando o ideal seriam estruturas ligeiras e ágeis perto das populações e com elas interagindo.

Nada de novo, dirão os pessimistas, mais planos e burocracia. Agora, conhecidas as causas do nosso insucesso colectivo e estabelecidas as linhas de desenvolvimento, falta o essencial, um verdadeiro choque de discriminação positiva em euros. Foi assim na Madeira e nos Açores.

O processo de candidaturas à construção do Museu de Arte Rupestre do Côa já encerrou. Definido o construtor, cumpridos os prazos (cerca de dois anos), disponibilizado o dinheiro (11,5 milhões de euros) nascerá a verdadeira estrutura que poderá aproveitar o património das gravuras em favor do desenvolvimento da região. Uma promessa feita a Foz-Côa há mais de uma década, tornada dívida, que tarda em ser paga.

Importa sublinhar a atribuição do Prémio Nobel da Paz a Muhammad Yunus pela criação do Grammeen Bank no Bangladesh, ideia feliz exportada para todo o mundo. Este conceito de microcrédito criado pelo laureado consistirá em emprestar dinheiro aos mais pobres dos pobres sem exigir garantias e, exclusivamente, com base na confiança. O que me parece mais importante e até revolucionário é que o criador do sistema põe em causa o paradigma da caridade cristã tão caro às sociedades ocidentais.

A metáfora contida no provérbio chinês “se vires um homem com fome não lhe dês um peixe, ensina-o a pescar” fica assim complementada e reformulada. Para além do aspecto educativo, torna-se indispensável emprestar algum dinheiro para adquirir a cana de pesca ou, no mínimo, facultar o acesso a uns metros de fio de pesca e a um anzol. Não será assim tão fundamental “dar o peixe”, como propõe a caridade, ou até “ensinar a pescar”. Com a possibilidade de adquirir os apetrechos, a necessidade se encarregará de lhe aguçar o engenho.

A sul - 9 de Outubro

Abrir a porta do desenvolvimento por fora

Os cinco concelhos que constituem a Associação de Municípios da Terra Quente Transmontana: Alfândega da Fé, Carrazeda de Ansiães, Macedo de Cavaleiros, Mirandela e Vila Flor vão criar uma sociedade de capital de risco, “uma espécie de garantia bancária” para ajudar empresas que queiram estabelecer-se naquela área geográfica. Esta será uma estratégia para tentar atrair mais investimento. Para já vão avançar com um milhão de euros para arranque da sociedade, prometendo que, se for preciso, não vai faltar dinheiro...
Os senhores presidentes da Câmara querem assim atrair empresas que produzam investimentos nos concelhos abrangidos e criem riqueza, fomentem o emprego e potenciam o desenvolvimento do interior.
Parece-me errada esta posição paternalista e burocrática de tentar abrir a porta do desenvolvimento por fora. As verdadeiras empresas que interessarão não são aquelas que procuram uma compensação imediata, mas cujos investimentos assentem em bases duradouras e em projectos sólidos e estáveis. São muitos os casos exemplares da falência e deslocalização de empresas no país e também na região que receberam fortes incentivos do poder central ou local.
A união de esforços deve visar a reivindicação dos investimentos públicos necessários da administração central que tardam em concretizar-se e congregar vontades com as instituições de ensino superior para privilegiar a dimensão imaterial do investimento com uma forte aposta em formação e inovação. Por último há que contar definitivamente com as potencialidades próprias, pois o desenvolvimento do interior depende essencialmente dos seus habitantes.

Um caso inacreditável

Uma parturiente do concelho de Carrazeda de Ansiães assistida no Centro de Saúde Local foi enviada pelo médico de serviço para a maternidade de Vila Real por opção daquela (esta cidade dista setenta quilómetros, Bragança situa-se a cem). O INEM informado do caso deu instruções ao motorista dos bombeiros que devia seguir o trajecto até Mirandela, obrigando a um aumento do percurso em cerca de quarenta quilómetros. Aí assistiu a mulher em trabalho de parto dentro da viatura dos bombeiros quando se encontrava a cerca de dois minutos do hospital mirandelense que tem um enfermeiro especialista permanente para este tipo de situações. Após a intervenção dos técnicos de saúde, a senhora acabaria por tomar a direcção de Vila Real.
Acrescente-se, que a mulher vive numa aldeia, a uma boa dúzia de quilómetros da sede da vila, onde os bombeiros locais a foram buscar por estrada sinuosa.
Como entender: O desacerto dos serviços de saúde? A desautorização do médico em serviço no Centro de Saúde de Carrazeda de Ansiães? A parturiente ser obrigada a deslocar-se a Mirandela e a dois minutos do Hospital local receber os cuidados necessários na ambulância que a transportava?
Alguém ainda tem coragem de ter filhos no interior do país!?

Multas

De há uns tempos a esta parte, os carrazedenses estão a assistir a formas de policiamento e de postura dos agentes da autoridade contrários aos que perduraram durante décadas.
São públicas e notórias a quantidade de multas passadas. O pior é que os autuados apenas têm conhecimento delas, semanas depois da infracção e por carta registada. Fala-se cerca de uma centena de cartas enviadas num mesmo dia, mil e cem no total, relatam os jornais, quase uma por habitante.
A fiscalização é quase em exclusivo efectuada em viaturas chegando-se ao caricato da perseguição com as sirenes ligadas a cidadãos que não colocaram o cinto de segurança.
Há locais na vila predeterminados em que por hábitos criados ou por deficiente sinalização são “apanhados” em infracções às dezenas sem que haja medidas de esclarecimento e períodos de tolerância.
Os casos relatados criam perplexidades, revolta e indignação nos residentes da vila. Por todo o lado circulam rumores de intolerância e excesso de zelo

A Sul - 25 de Setembro

Pinceladas

Bragança vai acolher temporariamente a sede da Fundação Rei Afonso Henriques em Portugal. Trata-se de uma instituição privada com participação pública criada em 1994, cujo objectivo principal é contribuir para o bem estar das gentes do vale do Douro, bem como, aprofundar as relações culturais, sociais e económicas entre a região e a comunidade de Castela Leão. Foi a grande responsável pela candidatura e posterior classificação do Douro Vinhateiro como Património Mundial por parte da UNESCO. Teve sedes em Zamora e até aqui no Porto. A falta de espaço na Invicta permitirá o seu funcionamento provisório em Bragança. Jorge Nunes, presidente da Câmara, disponibilizou instalações e adianta que vai entrar na disputa sobre a localização definitiva da sede.
Louva-se a possibilidade de deslocalização do organismo para esta cidade. Teme-se que a sua permanência seja acompanhada da perda de importância e dinamismo, fruto da diminuição de verbas e quadros, como nos foram habituando na chamada descentralização de alguns serviços.

O debate da 5ª Convenção da Euromontana que decorreu de 14 a 16 de Setembro em Chaves centrou-se nos desafios e oportunidades de desenvolvimento das áreas montanhosas e do mundo rural. Os grandes obstáculos ao desenvolvimento foram claramente diagnosticados e são, entre outros: a desertificação, as dificuldades da agricultura, o isolamento das populações e a necessidade de atrair pessoas.
As soluções apresentadas foram muitas: a aposta na Internet em banda larga, enorme aliado na mudança da qualidade de vida e na atractividade; a importância da promoção da imagem destas regiões e dos seus produtos locais, paisagem e herança cultural; a recompensa aos agricultores que cuidam do ambiente e da paisagem e que, entre outros "benefícios públicos", ajudam a evitar a degradação do património natural e evitam a probabilidade de incêndios.
São propostas que dificilmente veremos concretizadas a contar com o até aqui realizado. O encerramento de serviços públicos e das maternidades no interior é um claro sinal de que o Governo de Portugal nada quer fazer para atenuar os desequilíbrios regionais e a concentração de serviços no litoral e nas grandes cidades só aumentará o fosso que nos separa do resto do país.

No regresso às aulas o que se pede é tranquilidade. Dispensam-se os muitos "guerrilheiros" que aparecem à frente dos microfones e dos cadernos dos jornalistas e vociferam disparates vários. Apelam ao fecho e abertura de estabelecimentos escolares, ao boicote às aulas com a utilização das incautas criancinhas para reivindicar não se sabe bem o quê e que têm como única consequência incendiar ânimos e perturbar o acto educativo. Do outro lado da barricada, a administração escolar ajuda à gritaria, sempre predisposta a ripostar com críticas aos professores, aos pais e aos municípios. Para aumentar a confusão produz novas reformas, carradas de legislação confusa, modifica as regras e os procedimentos. Quando se espera motivação dos actores, alunos e professores, semeiam-se desânimos, frustrações e entropia geral. No meio da confusão surgem ainda dirigentes sindicais a contribuírem para a balbúrdia geral.
Em tempo de indefinições, o mais importante para as escolas seria a clareza de processos e, primordialmente, o silêncio e a serenidade. Calem-se todos um pouco: pais, dirigentes escolares e sindicais, especialistas e outros que tais e deixem os professores ensinar e as crianças aprender.

A recente polémica que envolve o Bento XVI e o Islão põe em evidência a tónica de intolerância e fanatismo que ao longo dos séculos a religião colocou no relacionamento humano. O Papa citou o imperador bizantino Manuel II Paleólogo no diálogo com um persa: "Mostra-me então o que Maomé trouxe de novo. Não encontrarás senão coisas demoníacas e desumanas, tal como o mandamento de defender pela espada a fé que ele pregava". Ao mesmo tempo que criticava os métodos próprios e alheios, antigos e actuais, explicava a irracionalidade das imposições e conflitos religiosos. As palavras com mais de seiscentos anos do imperador são esclarecedoras para as perversidades praticadas em nome de Deus, não só o islamismo. A necessidade humana do recurso ao divino, a proclamação doutrinal de justiça, paz e amor, as obras sociais meritórias, propaladas pela fé dos homens, não poucas vezes, são obscurecidas pelos sinais de intolerância entre crenças. Em nome de Deus justificaram-se todo o tipo de iniquidades, intolerâncias e mortandades.
A diferença fundamental entre as civilizações condicionadas pelas diferentes religiões, neste choque civilizacional, tem sido o crescimento, a ocidente, da laicização e da separação do sagrado e do profano “a Deus o que é de Deus e a César o que é de César”. Caso contrário não se teriam atingido os níveis de modernidade actuais expressos na melhoria de condições de vida, na liberdade e igualdade dos indivíduos.

A Sul -11 de Setembro

A sul

No capítulo geoestratégico da Europa e do Globo, a norte situam-se, regra geral, os países mais desenvolvidos e a sul posicionar-se-á o terceiro mundo. Assim o norte é culto, trabalhador, organizado e produtivo; o sul é inculto, pobre, indolente, desordenado. O norte está associado à boa orientação, ao exemplo a seguir; enquanto o sul é quase sempre esquecido e subalternizado.
Porquê “a sul”? Porque o autor desta coluna mora a sul do distrito. Porque não se pretende com as reflexões produzidas mostrar um caminho claramente definido, tão só fomentar a discussão e confrontar ideias. Porque se opta pelo ponto de vista da exigência, da frontalidade em confronto com a pasmaceira reinante dos interesses instalados. Porque é necessário agir contra a adversidade exposta na desertificação, na população envelhecida, na taxa de alfabetização e outros índices que nos inferiorizam face ao contexto nacional. Porque é necessário diversificar os horizontes e começar olhar … “a sul”


Nuvens cinzentas para o interior

No distrito de Bragança apenas um quinto (86 em 440) dos professores do Primeiro Ciclo dos Quadros de Zona Pedagógica obtiveram colocação no 1.º concurso de necessidades residuais. Em anos anteriores estes quadros não eram suficientes para atender às necessidades e houve sempre necessidade de recorrer a contratados. A desertificação humana obrigou ao encerramento de 225 escolas no distrito (cerca de três quartos do total) fruto da reorganização da rede escolar.
A situação que poderia ter sido há muito tratada e faseado no tempo, sempre foi escamoteada pelos responsáveis políticos e a administração escolar locais que fecharam os olhos ao óbvio: a diminuição da população escolar tornava insustentável de ano para ano a manutenção de escolas com uma, duas, três crianças… Aqui chegados, resta a conjuntura de quadros de pessoal docente sobredimensionados para os quais não se vê solução à vista, isto é, o que se fará a tantos professores com vínculo laboral ao Estado?
Os quadros não vão poder renovar-se nos próximos anos, o que quer dizer que os putativos candidatos a ingressar na carreira docente terão de varrer o distrito das suas justas aspirações profissionais, assim como os que alimentavam a ideia de regressar ao seu distrito de origem e mantinham por aqui uma residência, deverão questionar seriamente a possibilidade de ir habitar definitivamente fora da região. Aos que estão nos quadros paira a perspectiva angustiante da incerteza na manutenção dos lugares, bem como a possibilidade, cada vez mais fundamentada face ao novo estatuto em fase de aprovação, de terem de trabalhar em quadros de zona pedagógica limítrofes.
Dirão os mais distraídos que tudo isto é irrelevante, é uma questão de classe, por isso corporativista e pouco importará aos restantes bragançanos os problemas dos professores. Desenganem-se. É a região que fica sem quadros reflectindo-se o facto em todas as outras áreas da actividade económica. Mais, o que se passa com os professores reflectir-se-á brevemente em todos os outros sectores da administração pública, particularmente nos municípios, que têm sido os principais empregadores.
Esta conjuntura deverá merecer uma reflexão séria e consequente sobre a temática do desenvolvimento das regiões periféricas de molde a travar o seu contínuo despovoamento. O panorama presente dá a ideia de irreversibilidade na desertificação humana e estes são sinais preocupantes para o futuro do interior.
Sem o brado mediático do encerramento de qualquer fábrica no litoral, uma verdadeira revolução está a ser operada no mundo rural. Com o encerramento generalizado das escolas, as aldeias nunca mais vão ser as mesmas e encerra também uma das últimas esperanças para o mundo rural!

Desconsiderações

O ministro da Saúde, Correia de Campos, deixou nas mãos do conselho de administração do Centro Hospitalar do Nordeste a decisão sobre qual das maternidades deveria encerrar – Bragança ou Mirandela, porém a decisão foi anunciada pelo próprio numa ligeira entrevista de Verão ao JN (8/8/06).
Com uma argumentação que se considera falaciosa, explicou apenas que a razão era daquela ter “menos equipa” do que a de Bragança. Comparativamente, os factos são estes: Mirandela faz mais partos, é mais central para o distrito, possui melhores instalações, apetrechadas com equipamento mais moderno e um sistema anti-rapto. O senhor ministro basearia a decisão no facto do hospital de Mirandela só ter duas obstetras, menos que os especialistas que estão em Bragança. Só que, com a criação do Centro Hospitalar, os médicos trabalham de igual forma em Bragança, Mirandela ou Macedo de Cavaleiros.
Mais uma vez a lógica do centralismo prevaleceu e a manutenção da sala de partos na capital do distrito será apenas uma situação transitória, no futuro a população do sul escolherá Vila Real pela distância e qualidade de serviço.
Na mesma conversa ligeira de início de férias, entre risos, mais risos e a "importante" eleição da aspirina em detrimento do paracetamol, o nosso governante atestou também a incompetência dos Serviços de Atendimento Permanente (SAP) dos Centros de Saúde, dos quais é o maior responsável, ao dizer “vou directo à urgência do hospital … nunca vou ao SAP nem nunca irei”. Ou o senhor ministro pertence a um clã superior, ou não deve saber que uma parte da população portuguesa, particularmente a do interior, dispõe de um hospital a muitos minutos, até horas, de distância sem transportes públicos e a única alternativa que possui é o SAP. Se o sabe deveria tudo fazer para disponibilizar um mínimo de qualidade àqueles serviços ou então encerrá-los. O que não pode é com esta ligeireza produzir tais afirmações desrespeitando utentes e profissionais de serviços públicos.
Estas mesmas referências à população do litoral, uma decisão que visasse uma grande cidade, num outro país, esta entrevista não passaria impune e o senhor ministro teria de equacionar a demissão.